TENDÊNCIAS/DEBATES
JOSÉ OTÁVIO COSTA AULER JÚNIOR
Uma resolução recente da Comissão Nacional de Residência Médica tenta direcionar para essas regiões profissionais recém-formados
JOSÉ OTÁVIO COSTA AULER JÚNIOR
Uma resolução recente da Comissão Nacional de Residência Médica tenta direcionar para essas regiões profissionais recém-formados
Recente portaria interministerial, de número 2.087, que dispõe sobre o programa de valorização do profissional de atenção básica, procura corrigir um grave aspecto de nosso cenário social: a falta de assistência médica nas regiões remotas do país.
É sabido que nessas áreas, afastadas dos maiores conglomerados urbanos, grande parte da população por vezes atravessa toda a sua existência sem qualquer contato com algum profissional da saúde. Atacar esse problema é um acerto dos ministérios da Saúde e da Educação que tem o nosso apoio.
No entanto, há um equívoco que poderá afetar tanto o atendimento da população quanto a formação de nossos profissionais. Uma resolução da Comissão Nacional de Residência Médica, apresentada sem o devido diálogo, tenta direcionar médicos recém-formados, ainda não preparados para a prática da medicina, para essas regiões. Qual é a moeda de troca?
Conferir aos candidatos a concursos de residência médica que tiverem participado desse programa bônus de 10% ou 20% na nota de ingresso. Isso considerando que permaneçam um ou dois anos nas regiões consideradas na portaria. Assim, dificilmente essa iniciativa conseguirá fixar médicos fora dos grandes centros. Trata-se de um equívoco, portanto.
Esses médicos recém-formados, por ainda não possuírem a qualificação e a maturidade necessárias, acabarão expondo a si próprios e a seus pacientes à prática defeituosa da medicina, o que constitui uma situação perversa e danosa. Após um ou dois anos, irão regressar para os grandes centros com o cheque do bônus e competindo em vantagem com aqueles que não foram selecionados ou não se dispuseram a participar do programa.
O referido bônus compromete o pilar que sustenta os concursos públicos e universais: o mérito do conhecimento teórico e prático -nesse caso, amalgamado em seis anos do curso de medicina.
O Brasil forma 16 mil médicos por ano. Apenas 12 mil desses terão acesso a programas credenciados de residência médica. A residência tem deixado de ser optativa, constituindo-se em programa necessário para o complemento da prática profissional.
O que sugerimos aos órgãos governamentais é uma política corajosa, que amplie as vagas e fiscalize os programas de residência, de tal modo que todo recém-formado tenha oportunidade de consolidar seus conhecimentos em diversas áreas, incluindo aquela da atenção primária.
Esse programa dos ministérios será vitorioso se investir na própria sustentabilidade. É fundamental direcionar às áreas carentes médicos que já tenham cursado a residência, com contratos de trabalho e remuneração justos, para que possam se fixar e criar raízes nessas regiões.
Esses profissionais deverão estar inseridos nas redes de cuidados e amparados por recursos tecnológicos, colaboração de especialistas e centros de referenciamento, além de programas de educação permanente. Estabelecido esse novo cenário, o sistema público dará um enorme salto qualitativo no quesito atenção primária à saúde.
JOSÉ OTÁVIO COSTA AULER JÚNIOR é vice-diretor da Faculdade de Medicina da USP e professor titular da mesma instituição
Fonte: Folha de São Paulo on-line – edição de 07 de outubro de 2011.
Nenhum comentário:
Postar um comentário